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Publicado em 17/09/2022

A EXCLUSÃO FAMILIAR


Nos últimos tempos a questão da família tornou-se um dos elementos mais importantes nas diversas pautas políticas e agora aparece de maneira intensa nas propagandas eleitorais. Até que ponto nossos representantes políticos estão preocupados com as verdadeiras questões que atingem nossas famílias? Dão a impressão de estarem preocupados com os votos dos eleitores mais ingênuos.


Ao mesmo tempo, muitas lideranças religiosas empenham seu apoio a certos candidatos tomando por base esse mesmo discurso em prol da família. Parece que esse tema se tornou moeda de compra e venda (ops) no mercado eleitoral. Gostaria de refletir um pouco, de maneira introdutória, a respeito da questão relativa à exclusão familiar, tão desafiador para as religiões como para a sociedade, sendo um dos principais problemas investigados pelas ciências humanas.

Um dos maiores vultos da psicanálise, Jacques Lacan, dizia que “entre todos os grupos humanos, a família desempenha um papel primordial na transmissão da cultura”. Portanto, não precisamos nem dar uma fundamentação bíblica a respeito desse tema. A família exerce um papel determinante na estruturação da identidade pessoal e social da pessoa. É ponto pacífico na psicologia a consideração de que é na infância que se estruturam as bases para a pessoa enfrentar a vida e nesse processo tem papel determinante as funções materna e paterna (pai e mãe). Um não substitui o outro e nem incorpora a função do outro. Não há mãe-pai! Mas isso é problema para outro artigo.

No campo das Constelações Familiares, que é uma terapia alternativa já bem desenvolvida entre nós que busca identificar as causas de problemas e conflitos pessoais a partir de uma dinâmica de grupo, é certo afirmar que cada um de nós está ligado ao destino de nossas famílias das mais diversas formas, de maneira consciente e inconsciente. Em razão desse elo forte que nos une ao grupo familiar, não estamos isentos de problemas quando alguém é excluído, rejeitado ou esquecido no seio familiar.

Isso já é suficiente para concluirmos que a redução da questão da família apenas ao contexto da moral sexual ou religiosa torna a discussão não apenas objeto de infindáveis discussões, mas não atinge em geral os graves problemas que a sociedade atravessa. Por isso, a pauta política que os candidatos apresentam tendo a família como destaque não apenas é superficial, como também dissimula os reais problemas inerentes às famílias.

Interessa-nos refletir um pouco a respeito da exclusão que ocorre no seio familiar. Não haverá nenhuma solução do problema caso a opção seja pela indiferença ou esquecimento em relação ao membro excluído, chamado popularmente de “problema”, de “vergonha da família”, de “irresponsável”, etc. Imagina como ficará essa estrutura familiar caso se opte pela agressão, pela violência! Nesse caso, a exclusão alcança níveis que levam à própria destruição do outro. Como crescem os assassinatos especialmente os feminicídios dentro dos contextos familiares!

Além disso é preciso considerar que qualquer processo de exclusão executado hoje terá impacto nas gerações futuras. Ao mesmo tempo, exclusões ocorridas no passado produzem consequências atualmente nas gerações familiares que provenham dessa origem comum. Isso nos diz que qualquer membro de uma estrutura familiar é importante e para o bem do grupo não poderá em nenhuma espécie ser excluído. Aquele “problema” não pode simplesmente ser descartado.

Não há caso perdido na gênese de nossa estrutura familiar. Qualquer tipo de exclusão familiar traz graves e profundos desequilíbrios biológicos, sociais e psicológicos. Somos obrigados à tarefa de incluir todo membro familiar no presente para que se viva melhor hoje e não provoque desequilíbrios nas futuras gerações. Cada pessoa deve encontrar um lugar na alma de cada membro da família. Ninguém é tão poderoso que seja capaz de “deixar para lá”. Carregamos sempre o outro conosco, mesmo morto.

A identificação de alguma espécie de exclusão no seio familiar é o primeiro passo para a busca de solução para inúmeros problemas que atropelam a convivência familiar. É muito cômodo imputar ao filho “problemático” como alguém desajustado, que se perdeu em função de más companhias. Há que se ter um enorme esforço de conhecimento para encontrar o nó desse desajuste. Enquanto esse nó não for desatado, o que não acontece por milagre religioso como tantos buscam, a situação não apenas deverá continuar, mas irá se agravar.

Assumir a realidade daquele fato, daquele “problema”, de maneira corresponsável, será o caminho para se encontrar uma boa solução para cada um do núcleo familiar e para os outros. Dificilmente outras instituições, externas à família, terão êxito tão alvissareiro sem a luta radical pela inclusão familiar. Grande parte dos problemas que os professores encontram nas salas de aula tem sua origem na estrutura familiar presente ou passada.

A título de exemplo podemos mencionar a questão das separações que ocorrem entre os casais. Quando isso acontece, é preciso tomar inúmeros cuidados para que o outro não seja excluído sob a forma de assassinato como temos visto crescer essa prática entre nós. Mas também nas separações não deveriam acontecer exclusões como um descarte do outro, como negação do outro, ou destruição da pessoa do outro sob diversos aspectos.

Têm sido noticiados diversos processos jurídicos de condenação de pais por “abandono afetivo” e muitos homens se queixam que estejam dando a pensão de maneira regular e podem também serem condenados. É pelas mãos do pai que a criança ganha caminho no mundo, pois seu olhar volta-se para a amplitude, para além dos limites da função materna. Por isso estão equivocadas aquelas mães que se dizem cumprir a função de pai e de mãe.

Por fim, parece-nos que o melhor caminho para tratar da inclusão familiar seja aquele que busca desenvolver processos de cuidado com as estruturas familiares, sejam elas quais forem. Com casamento ou não, cada estrutura familiar tem um papel determinante na saúde da sociedade. Quando crescem as situações de exclusões familiares, elas irão repercutir nas instituições sociais especialmente na escola. Sem esse cuidado que antecede a ida à escola dificilmente o processo educativo terá eficácia no desenvolvimento de cada criança, cada jovem. A exclusão familiar representa um dos mais graves e complexos problemas que impacta a sociedade atual.

Edebrande Cavalieri - O autor EDEBRANDE CAVALIERI é Professor Titular da Universidade Federal do Espírito Santo na área de Filosofia por 33 anos. Doutor em Ciências da Religião pela UMESP-SP e autor dos livros: Via a-teia para Deus e a ética teleológica a partir de Edmund Husserl, EDUFES, 2012; Estudos de Fenomenologia da Religião, CRV, 2018; Ética e Religião, CRV, 2016; Conjuntura eclesial e religiosa, CRV, 2020. Para adquirir entre em contato com o Prof. EDEBRANDE CAVALIERI pelo telefone: +55 27 99989-6254



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